sábado, 23 de julho de 2011

Histórias Íntimas de um Homem Feio.

A capa do livro é sugestiva – um buraco de fechadura que lembra a genitália externa feminina. Intencional ou não, ilustra o livro da historiadora Mary del Priore – Histórias Íntimas, Sexualidade e Erotismo na História do Brasil, que se torna, pelas mãos da autora, documento vivo para que se compreenda o real e o imaginário da sexualidade humana. Desde Isabel de Castela, que morreu sem mostrar parte alguma do seu corpo, mesmo aos médicos que tentaram atendê-la, até os nossos dias, a autora, em extenso estudo, ventila o arquivo histórico de nossa sexualidade.
Afinal, por que falar deste livro tão interessante, já que claramente não tenho a menor qualidade para crítico literário? Durante a sua leitura, casualmente, vi em programação rotineira da TV, um importante homem da República a falar, academicamente, sobre relevante fato do nosso cotidiano. “Que homem feio!”, pensei casualmente. Embora muitíssimo bem-vestido, a importante figura parecia extremamente frágil em suas eruditas considerações. Escondia, ao que me pareceu, em cada citação doutrinária, o lado contrário de sua exuberante indumentária. Era, afinal, apenas um homem feio. Dito desta maneira, parece coisa politicamente incorreta.
O homem feio, certamente, não é aquele cuja fisionomia, postura, linguagem corporal, facilidade de expressão não são rigorosamente atraentes. Lembro-me, a propósito, de famoso ator do cinema francês, de algumas décadas passadas, Jean Paul Belmondo, que arrancava suspiros femininos nos quatro cantos do mundo, embora não fosse exatamente um homem bonito. Penso que, ao contrário da mulher, onde a beleza é essencial, como queria Vinícius de Moraes, esta qualidade no homem passa ao largo da aparência física.
Ao homem bonito basta apenas uma qualidade, rara, mas apenas uma – ser amado. Essa manifestação do afeto traz, implicitamente, a qualidade do belo, da beleza. De modo que, ao achar o homem feio, embora poderoso, tenho cá comigo que jamais terá experimentado uma genuína, verdadeira e fundamental carícia feminina, o desejo sexual pelo seu corpo ou, ainda, sequer o mais singelo olhar de uma mulher apaixonada. A ele resta, então, aferrar-se ao poder, que funciona tão somente como um sucedâneo do amor.
Edgard Porto é psiquiatra


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